segunda-feira, 16 de junho de 2014

EU, DA POLTRONA – Croácia soube entender o Brasil, mas não compreender


Cláudio Messias*

Esperei passar o primeiro jogo, da zica, para me posicionar sobre a Seleção de Felipão. Não emiti opinião desde a convocação, para não correr o risco de gorar o patrimônio futebolístico nacional. Agora, passado o susto, entro logo de cara nos detalhes que implicam na composição do elenco que há dias está na Granja Komari. É chato, porém necessário. Lá na frente, daqui a pelo menos 4 jogos e no máximo 7 confrontos, esse fator terá peso.

Na minha Seleção existe uma dupla que é gêmea siamesa. Se Neymar é o futuro melhor jogador do mundo, Ganso já é o melhor meia de armação em atuação no futebol brasileiro. Oscar é ótimo, concordo, mas Ganso seria o seu substituto imediato, e não William. Revejamos o que Neymar e Ganso já produziram juntos e chegaremos à conclusão de que o brilho das pernas de Bernard está mais para efeito de depilação do que de qualquer tipo de alegria. Se fosse isso, Ganso e Neymar dão felicidade ao futebol e pronto. Quatro anos atr[as chamávamos Dunga de burro por não ter levado Neymar e Ganso à África do Sul.

Felipão ignorou que há, no Brasil, em franca atuação, um meia que já levou para casa o título de melhor jogador do mundo, atribuição da dona Fifa. Se não quis levar Ganso, que tivesse levado Ronaldinho Gaúcho. Pirlo, da Itália, anunciou a aposentadoria após o Mundial de Seleções da Fifa. É mais velho que Ronaldinho, com quem esteve no espetáculo de 2002, na Copa da Alemanha. Naquele primeiro título de Felipão havia alegria, brilho, nas pernas do dentuço. Uma alegria e uma felicidade que transcenderam o comum com o hit “deixe a vida me levar”, nop pandeiro do craque.

Por fim, terminado o jogo inaugural dessa primeira rodada da Copa eu comentava com meu filho, via torpedos de celular, sobre uma situação inusitada. Felipão tirou Hulck e colocou Bernard. Tudo bem, o campinagrandense daqui, de minha terra, não estava bem. Mas, Bernard entrou e nada mudou taticamente. Então, fico elucubrando: e se a Seleção tivesse Lucas no banco¿ Pois é. Ele não está nem convocado. E na minha opinião faria o inferno na defesa da Croácia, pois foi o trio Neymar, Oscar e Lucas que deu ao Brasil o título Sul-americano de 2010, motivo da cobrança por uma convocação de Dunga para a Copa da África do Sul.

Chorar leite derramado, uma hora dessa, é comportamento vão. Até porque o Brasil fez sonoro 3x1 na Croácia e estamos com a sensação de que está tudo bem. Ignoramos que durante a semana o treinador croata e seus craques vociferaram sobre os defeitos que, presentes no frágil sistema tático de Felipão, eram passíveis de ser explorados nessa tarde de Dia dos Namorados. A cada telejornal em que o primeiro gol da Copa, da Croácia, foi marcado, observemos nas costas de quem acontece a jogada que dá origem ao lance. Como complemento, busquemos na memória que segundo os croatas os meios-de-campo de Brasil e Croácia se equivalem e que seria pelos flancos, pelas laterais, pelas extremidades, o aproveitamento de fragilidades observadas em Daniel Alves e Marcelo.

No replay, a Croácia rouba a bola onde¿, sim, no meio do campo. E avança pela esquerda, nas costas de Dani Alves. De forma patética a bola vai passando pela competente defesa brasileira até resvalar, acidentalmente, no pé de Marcelo. Falha de Daniel Alves, mancada de Daniel Alves. Os dois laterais, antecipadamente declarados como alvo da Croácia, falharam e calaram com um silêncio que começou na Arena Corinthians e ecoou Amazônia afora. Sim, raro e exceto leitor, nossos adversários sabem entendem o nosso futebol. Difícil, porém, é compreender-nos. E a Croácia não compreendeu.

O placar final de 3x1 é injusto pelo que foi o jogo. Antes, no bolão, eu havia apostado em 1x1. Felizmente, perdi. Mas, no resumo geral vi uma Croácia que lutará pela segunda colocação do grupo, podendo estar à frente até mesmo do México. Camarões é, sempre, uma loteria. E no fundamento gol, justíssimo o primeiro, de Neymar, que chutou fraco, mas consciente. O futuro melhor jogador do mundo quis colocar a bola naquele canto. Errou, apenas, no jeito de bater na bola. Alguma dúvida de que na Copa de 2018 ele colocaria essa bola, com efeito, no canto superior esquerdo¿

Não foi pênalti em Fred e, portanto, se a cobrança de Neymar tivesse parado nas mãos do goleiro croata teria sido feita a justiça do futebol. Magoaríamos, mas terminaríamos a noite sorrindo da mesma forma, pois Oscar fez o que é raro. Digo isso porque somente quem é craque sabe fazer gol de bico bonito. Oscar tinha que chutar, mesmo, de bico, para pegar o goleiro adversário sem tempo suficiente para cair e defender. Creio que esse terceiro gol, que sacramentou o placar definitivo e eliminou a choradeira croata contra a péssima arbitragem japonesa escalada pela Fifa, será repetido e eternizado pela história das Copas, dada a genialidade da visão de jogo de Oscar. Tem muito jogador que daqui, de fora da área, tentaria cortar o zagueiro pelo meio e, ao chutar, consagraria o goleiro adversário, que taparia o ângulo.

A cada substituição feita por Felipão nos 90 minutos eu observava as opções de banco e dizia comigo mesmo: meu Deus. Ter Jô como opção a Fred é de chorar. Felipão olhou para o Atlético Mineiro e viu Bernard e Jô. Só faltou levar Cuca para ser seu auxiliar técnico. Ignorou Ronaldinho Gaúcho para levar essa dupla que até jogou alguma coisa na Copa das Confederações. Mas, Copa das Confederações e campeonato estadual são a mesma coisa. Rendem boas disputas mas não valem nem o cachorro-quente que se come. É como ser eleito síndico do condomínio e já sentir-se vereador eleito.

Daquela Seleção de um ano atrás vejo Luiz Gustavo calando minha boca. Não é melhor que Fernando, cuja falta de visibilidade o colocou no ostracismo de tal forma que, agora, nesse momento, nem sei em que time encontra-se. Quando estava no Grêmio só não era melhor volante que Paulinho, apesar de as posições serem inversas (é mais defensor, enquanto Paulinho, Hernandes e Ramirez são mais armadores). Mas, Luiz Gustavo tem algo a mais do que aquele ridículo bigode da década de 1920, que faz lembrar Ataulfo Alves. Equilibrado, é ótimo marcador, comete menos falta que seus concorrentes e é um Einstein se comparado a Felipe Melo, o troglodita.

Vi Kaká na beira do gramado e realmente, nessa Seleção, com a ausência de Ganso e Lucas, o menino bonitinho só poderia, mesmo, estar ali, na beira do gramado, pegando bolas. É cria da enganação que, partindo de Galvão Bueno e Casagrande, o péssimo, um dia fez o Brasil acreditar que haveria um tal quadrilátero fantástico. Até que o Brasil caiu realmente de 4 quando Roberto Carlos baixou para ajeitar o meião e quando ergueu a cabeça a França estava classificada e o Brasil, voltando para casa, desde a Alemanha. O mesmo quarteto fantástico que afundou Ronaldinho Gaúcho, pois colocou dois jogadores da mesma função – ele e Kaká - para se matar, em credibilidade, no mesmo espaço de gramado. Só na cabeça de Galvão Bueno, que tem barulho de carburador, aquilo era viável.

O goleiro Júlio César não comprometeu, mas também não foi tão exigido. Entendo que o goleiro croata tenha sido mais exigido com jogadas de gol real. Sobre a defesa como um todo, sem comentários. David Luiz e Thiago Silva são os melhores em atuação na Europa. E contam com a guarnição perfeita de Luiz Gustavo e Paulinho, que fecham o meio e dão fundamento às pertinentes observações preliminares da Croácia. O negócio fica comprometido quando Daniel Alves, que já não é mais o mesmo – e isso é normal –, e Marcelo falham. Repito: revejamos o gol croata e perceberemos o quão frágil estão nos nossos flancos.

Afora isso tudo, lamento que Hulck tenha sido pouco explorado. Tem explosão muscular, volta para marcar, é guerreiro e sabe bater na bola. A questão é que nesse sistema tático do Felipão, de 4>2>3>1, Hulck joga ao lado de Neymar e Oscar, mas como ajuda na proteção para as investidas de Paulinho, quando recebe a bola não tem condições de finalização. E trata-se de um atacante, que poderia estar ao lado de Fred na frente, desde que Paulinho não fosse um volante de armação com incumbência de finalização. Até porque o saldo, hoje, foi Paulinho tendo mais chances de finalização que Hulck.

Fred, apesar de lento, é um mal necessário. Ainda mais em uma Seleção que apresenta, no banco, a opção de Jô, que representa troca de seis por meia dúzia. Há poucos centroavantes em atuação no Brasil. E Fred é, de sobra, o melhor deles. Minha segunda opção seria Leandro Damião, mas isso representaria igual troca de nada por coisa nenhuma. Digo isso porque, repito, um ataque com Neymar, Lucas e Oscar, com Ganso armando pelo meio, caberia perfeitamente como segunda opção caso Fred não entrasse bem nos confrontos. Enfim, Fred, pelo que fez e tem feito nos últimos 4 anos, é merecedor da camisa 9.

Felipão continua não escapando da minha crítica. Sim, reconheço que seja melhor opção em relação a Mano Menezes, pelo que produziu em tão pouco tempo de comando. Mas, falou hoje e foi salvo por ocasiões individuais. A Seleção nada melhorou com as alterações feitas pelo treinador. E se Neymar fez gol em pênalti duvidoso, Oscar selou o placar de 3x1 mediante uso de sua individualidade e genialidade. As saídas de Hulck e Paulinho reduziram o potencial marcador do time. Basta ver que Hernandes, que sempre passa peças em Copa, levou cartão amarelo em menos de 15 minutos dentro de campo, ao passo que Paulinho saiu do jogo sem punição.

Terça-feira a Seleção joga suas cartas contra um adversário a meu ver mais frágil que a Croácia. Continuo vendo os croatas como uma das forças futuras do futebol, pela competência com que entendem taticamente seus adversários e pela força com que assumem seus jogos. Não vai demorar muito e começarão a ganhar títulos na Europa, passo inicial que seleções como a de Portugal galgaram. Portugueses treinador pelo mesmo teimoso Felipão, hoje incapaz de ver que seus adversários o entendem o suficiente para neutralizá-lo taticamente. O que sobra ao treinador brasileiro é, tal qual Mano Menezes, fica à beira do gramado mais preocupado em reclamar de arbitragem do que necessariamente corrigir seu time.

O México depende de nomes isolados para sonhar com uma boa Copa. Tende a tomar sustos contra Camarões amanhã. Prefiro, pois, aguardar esse confronto para dizer sobre as chances de cada uma das três seleções ocupar a segunda colocação do grupo, atrás do Brasil. Com a derrota da Croácia, hoje, o México pode ser uma das classificadas. Dependerá, pois, do confronto direto que terá com os croatas na segunda rodada, semana que vem. Meu palpite no bolão, para amanhã, é México 2x2 Camarões.

*Professor universitário, historiador e jornalista, é mestre e doutorando em Ciências da Comunicação pela ECA-USP.


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