quinta-feira, 27 de junho de 2013

EU, DA CORNETA - Brasil só não pode levar final para os pênaltis


Cláudio Messias*

Aqueles que anunciaram durante um mês o espetáculo espanhol na Copa das Confederações esqueceram de avisar, com antecedência, a Itália. O que vi, hoje, foi uma Itália que fez jus à condição de tetra-campeã de Copas do Mundo e uma Espanha que experimentou esse feito somente uma vez. Confesso que tinha dúvidas da suficiência do futebol italiano, principalmente depois da final de um ano atrás pela Eurocopa. Dúvida, contudo, significa 50% de certeza de sim e 50% de convicção pelo não. Meus outros 50% de desconfiança recaíam sobre a prevalência, sempre, do futebol técnico sobre o futebol tático.

A Espanha, eu já disse aqui, tem um futebol pragmático. É dessa forma burocrática de jogar que o Barcelona dominou o cenário universal do futebol nos últimos anos. Falamos de um futebol Coca-cola, questionado por muitos, mas apreciado por todos. Ninguém sabe entender direito a fórmula do futebol espanhol, seja no campeonato espanhol, seja na UEFA Champions League. Ops... não sabíamos. A queda de Barça e Real Madri perante aos igualmente táticos e burocráticos alemães deu sinais de que a fórmula secreta da Coca-cola vazou.

Já vi uma Espanha com dificuldades na estreia contra o Uruguai, nessa Copa das Confederações. Fez 2 a 1, que poderia muito bem ser 1 a 1, pois o primeiro gol saiu na sorte, em falha lamentável da zaga uruguaia (gol contra de Lugano). E fosse aquele jogo de estreia uma partida com prorrogação e o Uruguai teria vencido, pois já na abertura os espanhóis mostraram que estavam cansados. E olha que nem ido direito à zona e levado as marias-chuteiras ao hotel eles tinham ainda. Chegar cansado de fim de temporada na Europa não era, aqui, exclusividade deles, pois as demais seleções tinham e têm, todas, jogadores que também brilham naquela constelação do futebol universal.

A partida da Espanha contra a Nigéria mostrou bem o quão volúvel é esse atual campeão do mundo e da Europa. Continuo, pois, questionando quem e em que condições é a pessoa que controle o tempo de posse de bola pela Fifa. Naquela derradeira partida da fase de grupos a Espanha não repetiu o sonolento toque de bola que faz dela um Barcelona com jogadores exclusivamente espanhóis. No primeiro tempo, principalmente, o forte e veloz elenco africano foi melhor, teve mais chances, pecando, contudo, pela ingenuidade de atacar em bloco e abrir as laterais para o contra-ataque letal da Fúria. Ali, enfim, vi falhas no sistema tático que tanta posse de bola dá aos campeões da Copa da África do Sul.

Com meia hora de hoje, em Fortaleza, Shakira aparecia mais no telão do Castelão do que o ataque espanhol na defesa da Itália. Segundo a Fifa, eram 6 chutes a gol da Itália, naquele momento, contra apenas 1 da Espanha. O fator decisivo para essa superioridade italiana, a meu ver, estava em um detalhes simples no mundo da bola: a técnica supera a tática. A Itália tem de tudo para disputar o título da Copa de 2014, sim, exatamente porque tem as mesmas qualidades do futebol brasileiro. Se tomou 4 na final da Eurocopa para essa mesma Espanha, é porque não conseguiu impor a sua técnica diante do burocrático sistema de compactação de espaços que os espanhóis conseguem fazer tão bem.

Houve um momento, na semi-final de hoje, que os italianos fizeram a bola girar com toques de primeira, rápidos, e com inversão perfeita de posições. Esse rodízio quem está acostumado a fazer é o time espanhol, apático perante a posse de seu feitiço. Azar da Itália Balotelli ter ido embora mais cedo da competição. Faltou a ousadia dele, que tem requintes de Neymar nas pernas e cérebro de Edmundo, o animal. A Itália, ousou, sim, mas não teve malícia, catimba. Tanto que a Espanha passou 120 minutos sem ceder o maior dos desejos italianos, que era uma falta nas redondezas da grande área, para a consagração de Pirlo.

No segundo tempo prevaleceu a gama de opções táticas que a seleção da Espanha tem na carteira. Sabendo do cansaço italiano os espanhóis compactaram no sistema 3-5-2 e, assim, deram a sonhada liberdade a Iniesta, com Xavi mais recuado. Naqueles momentos finais do tempo normal imaginei que Villa entraria, mas aquilo significaria abrir demais o espaço para as saídas rápidas que os italianos davam nos contra-ataques. Villa não sabe marcar e quando em campo faz reduzir o poder ofensivo de Iniesta, que tem de fechar o espaço aberto pelo meio.

Passada a prorrogação, momento desastroso do mundo do futebol - sou contra esse tipo de prolongamento da igualdade -, deu no que deu. Espanha e Itália não tinham mais fôlego, nem pernas, nem futebol. Mas, têm a qualidade que caracteriza técnica e taticamente o futebol europeu nos últimos anos. São excelentes batedores de penalidades. E quando a bola não entra, vai para fora a partir das pernas de um zagueiro. Castigo para a Itália sair dessa forma, mas o teria sido igualmente injusto se o episódio acontecesse com a Espanha, que tem nas costas o peso de ser a melhor Seleção do século até aqui.

Brasil e Uruguai vão para o Maracanã em vantagem sobre, respectivamente, Espanha e Itália. Os espanhóis chegam na final tendo jogado um dia depois dos brasileiros e, pior, tendo ficado em campo, sob calor de 34 graus, durante 120 minutos, além do estresse emocional das 5 penalidades convertidas em gol. Pior ainda para os espanhóis, que chegarão ao Rio de Janeiro igualmente quebrados e terão pela frente um Uruguai que não economiza nas pancadas.

Arrisco dizer que o Brasil ganha da Espanha, pois o futebol, defendo, tem uma lógica, sim, apesar de muitos a ignorarem. Cada jogo é um jogo, assim como uma coisa é uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Mas, vencemos,e bem, a mesma Itália que tanto sufoco deu na Espanha que encaremos na final. Se foi a técnica italiana o fator que rompeu a hegemonia pragmática da Espanha, técnica é o que não falta para essa jovem Seleção brasileira. Temo, sim, por alguns jogadores que me fazem colocar em xeque a formação que Felipão considera titular.

O contestável Luiz Gustavo é insuficiente para jogar e encarar a velocidade com que Xavi e Iniesta conduzem o meio de formação da Espanha. Ali, a meu ver, tem de estar Fernando, jogando ao lado de Paulinho e, assim, permitindo que este possa ser o elo de surpresa quando o trio Oscar>Neymar>Hulck partir em triangulação para encontrar Fred posto na frente, ora como centro-avante, ora como pivô mediador de distribuição. Na zaga, a luz amarela está acesa para a ainda imatura titularidade de David Luiz, que deveria ter um zagueiro mais experiente para auxiliar-lhe mas encontra um instável Thiago Silva, que nessa Copa das Confederações está falhando demais. Daqui até 2014 entendo que do meio-campo para trás tenha de ocorrer mudanças e mais testes e observações da parte de Felipão.

No ataque, pelo amor de Deus, será a velocidade e a explosão física de Lucas que fará de Neymar e Fred o pilar do sistema 4-4-2 que Felipão tanto tenta fazer dar certo mas que até agora não brilhou. Ele e muita gente continuam iludidos com Bernard, mas no segundo tempo contra a Espanha o Maracanã gritará, com certeza, o nome de Lucas. Velocidade é o segredo para penetrar nessa quadrada defesa espanhola, mas a individualidade prevalecerá. Nesse aspecto, já estou vendo as orelhas de Fred e Neymar ardendo pelas cotoveladas de Sérgio Ramos, um zagueiro sujo, desonesto e que apela para a pancada como forma de intimidação. Basta lembrar o que ele fez para segurar o polonês Lewandovsky, do Borussia Dortmund, pela Liga dos Campeões da Europa meses atrás.

Se for repetida a igualdade de hoje, entre duas seleções, na final da Copa das Confederações, a Espanha pode pegar a taça e levar para a galeria em Madri. Não temos batedores e abrimos uma exceção de conquistas nessa forma de disputa em 1994, e, ainda por cima, naquele sufoco que nos deu o tetra pelos pés de Baggio. Se a Itália não tivesse repetido o erro histórico de Baggio, hoje, a decisão da vaga na final de domingo estaria sendo disputada até agora, pois a Espanha simplesmente não erra cobranças de penalidades.

*Professor univerrsitário, historiador e jornalista, é mestre em Ciências da Comunicação pela ECA/USP.

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